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Mar & Arte

Artesanato Urbano de Coisas Ligadas ao Mar (e outras)

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Artesanato Urbano de Coisas Ligadas ao Mar (e outras)

04.01.18

25 - Modelismo Naval 7.1 - "Cutty Sark" 1


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Caros amigos

 

Publiquei neste blogue, no ano de 2015, um conjunto de cinco posts com os números 16, 17, 18, 19 e 20 sob título - “Modelismo Naval 4 – Os Fabulosos Clipper’s da China” - que abordavam uma coleção de pratos em faiança, adquirida em 1990 nas edições Philae, onde figuram 9 clipper’s (num dos pratos são representados dois clipper’s) pintados à mão por Martim Lapa, mestre pintor português.

Nestes clipper’s – que também são conhecidos pelos "Clipper’s do Chá", "Clipper’s do Ópio" e "Clipper’s Negreiros" – já que ao longo da sua vida útil serviram para transporte destes “produtos”, entre outros – não foi incluído o emblemático “Cutty Sark” por razões que desconheço.

Na altura tinha iniciado a construção de um modelo do “Cutty Sark”, com planos dinamarqueses da “Billing Boats”, que se arrastou por todo o ano de 2016 e pelo de 2017 e só terminou há aproximadamente três meses.

Naturalmente que não me dediquei a tempo inteiro à construção deste modelo. Desenvolvi outros projetos em simultâneo, uns que já foram terminados, outros que ainda continuam. Mas a parte final do projeto, a montagem das velas e dos aparelhos fixos e de manobra, além de ser de uma certa complexidade - apesar dos planos das moradas dos cabos serem impecáveis - foi bastante monótona e repetitiva o que me levou, por falta de paciência e cansaço, a dedicar pouco tempo ao final do projeto. Com vários empurrões, por fim acabou!

Nos três posts que irei apresentar, este e os dois seguintes, irei abordar o “Cutty Sark” em três perspetivas, a saber:

  • Num primeiro, o “clipper” real na caracterização técnica da construção;
  • Num segundo, o “clipper” real na sua história;
  • Num terceiro, o modelo que construí.

“Cutty Sark” - o Navio

 

 Cutty Sark – Greenwich - 1994

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Visitei o “Cutty Sark” em Agosto de 1994, ainda na versão anterior ao incêndio de 21 de Maio de 2007 e ao mais recente de 25 de Abril de 2012 que levou à sua restauração tendo ficado com o aspeto que hoje apresenta na doca seca de Greenwich na Inglaterra.

 

  Cutty Sark – Greenwich - 2015

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O imaginário skipper do “Cutty Sark” em 1994

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Ali, bem perto da doca seca, situa-se o “Museu Marítimo da Grã Bretanha”, conhecido pela qualidade da sua coleção de modelos de arsenal históricos antigos bem como de astrolábios e de outros apetrechos ligados à navegação marítima que, como não podia deixar de ser, foi percorrido atenciosamente e analisado em todos os seus pormenores, tendo descoberto que existia uma vitrina onde se encontram expostos, com algum destaque, modelos de barcos típicos portugueses.

 

O “National Maritime Museum” em Greenwich…

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  …e os modelos de alguns BarcosTípicos Portugueses 

 No sentido dos ponteiros do relógio: Muleta do Seixal, Falua, uma senhora toda risonha, Barco de Pesca de Mira? ou Vieira de Leiria? e Barco Rabelo 

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Pelo caminho, entre a doca seca e o museu, aproveitou-se para subir a colina que leva ao “Observatório Astronómico” e pôr um pé no Oeste e outro no Este no “Meridiano de Greenwich”.

 

No “Meridiano de Greenwich”

Um pé de um lado e um do outro

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O “Cutty Sark” foi construído em 1869 pela firma “Scott & Linton”, formada no ano anterior pelos jovens desenhadores Hercules Linton (1836-1900) e William Scott (1847-?), com estaleiro no rio “Leven” em “Dumbarton” - num local onde anteriormente se encontrava a firma de construtores navais “William Denny & Brothers” – para John “Jock” Willis, o proprietário de uma companhia de transportes marítimos fundada pelo seu pai que tinha uma frota de “clippers” que regularmente faziam o transporte de chá da China para a Grã-Bretanha.

 

A popa de linhas redondas foi uma das principais características dos clippers em claro contraste com os desenhos que tinham imperado até aí. A ideia tinha uma base hidrodinâmica empírica: facilitar a expulsão suave da água depois de atravessar as finas linhas do casco.

 

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Em plena altura da “Corrida do Chá” - competição que envolvia diferentes “clipper’s” durante a viagem da China para a Grã-Bretanha e que trazia, para a equipagem vencedora, prémios pecuniários tentadores e para o (s) proprietário (s) vencedor (es) prestígio e o ganho em apostas efetuadas durante a competição (para mais informação sobre a “corrida” e o transporte do chá consulte os posts 16, 17, 18, 19 e 20 deste blogue)o desenho deste veleiro acarretou o estudo de outros modelos existentes na companhia, quer de matriz Inglesa quer de matriz Americana e de outros no estrangeiro, tendo a escolha recaído sobre o “Thermopylae” construído em “Aberdeen” na Escócia, nos estaleiros de Walter Hood & Co., que tinha sido lançado à água no ano anterior a 19 de Agosto e que tinha estabelecido um recorde de 61 dias de porto a porto na viagem inaugural de Londres a Melbourne na Austrália.

 

O rival do "Cutty Sark" - O "Thermopylae"

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 Foi precisamente o proprietário do “Thermopylae”, George Thompson que desafiou John “Jock” Willis assegurando que o “Thermopylae” era o clipper mais rápido jamais construído.

 

A bitácula do “Cutty Sark sob a retranca da mezena na coberta

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O “arquiteto” do projeto foi Hercules Linton, não sendo bem claro como foi escolhido o formato do casco. Sabe-se que envolveu a compra por Willis de dois navios – o “Tweed” uma fragata francesa e um outro – e que foi com base no “Tweed” – que serviu de modelo em tamanho real e que foi transformado através do alongamento do casco – que Línton efetuou diversas modificações em todo o navio e ajustamentos na popa e na proa, já que o navio tinha ficado demasiado grande e bojudo para o efeito de ser um vencedor de corridas do chá.

 

As linhas do casco do “Cutty Sark”

 

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A relação meia-nau/boca nos Paquetes da época era de 4:1, com a proa arredondada e a popa retangular. Nos Clippers, esta relação era de 5 ou 6:1 e tanto a proa como a popa eram aguçadas

 

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O contrato para a construção do “Cutty Sark” foi assinado em 1 de Fevereiro de 1869 com a firma “Scott & Linton” e exigia que o navio fosse construído num prazo de seis meses a um custo de 17£ por tonelada e um peso máximo de 950 toneladas. As normas de construção do navio deveriam ser “Lloyd’s A1” (A mais alta classificação da Lloyd’s indicando a letra A que o casco do navio é de 1ª classe e o número 1 que os restantes apetrechos estão em conformidade; por outras palavras, que o navio é navegável quer interior quer exteriormente) e a supervisão da construção em nome do proprietário seria feita pelo capitão George Moodie que estava indicado para o seu comando.

 

O registo da “Lloyd’s” no casco do “Cutty Sark”

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O trabalho de construção sofreu uma interrupção devido ao estaleiro ter ficado sem dinheiro para os pagamentos da mão-de-obra tendo esses pagamentos sido assegurados pela firma de construtores navais “William Denny & Brothers” (os anteriores donos do espaço do estaleiro) que completou o navio. O navio foi lançado em 22 de Novembro de 1869 pela esposa do capitão Moodie, mastreado posteriormente e rebocado para Greenock onde foi instalado o restante equipamento.

 

O “Cutty Sark” visto pela popa. Podem-se observar os diferentes mastros com o respetivo aparelho, sendo bem visível o mastro da mezena com a respetiva carangueja e retranca.

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Basicamente, as obras mortas do navio foram construídas de Teca Indiana e as obras vivas de Olmo Americano tendo sido aplicado também outro tipo de madeiras tais como Pinheiro Amarelo, Carvalho Inglês e outras.

O casco foi recoberto por chapa de cobre até à linha de flutuação com o fim de defender a madeira dos ataques do “teredo” que proliferara nos mares tropicais.

A quilha foi substituída na década de 1920 por uma de Pinheiro.

 

O mastro do gurupés

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Os clippers como o "Cutty Sark", são classificados como "Extreme Clippers". Eram navios muito rápidos que sacrificavam a capacidade de carga à velocidade o que lhes possibilitava viagens de longo curso em pouco tempo em relação á época, especialmente adaptados para o transporte a longas distâncias de produtos mais perecíveis.

 

O “Cutty Sark” visto pela amura de bombordo. É de salientar as proporções colossais das vergas em relação aos mastros

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No entanto, encontram-se clippers deste tipo no transporte de todo o tipo de mercadorias além do chá (lã, carvão, nitratos, etc) bem como de passageiros nomeadamente de imigrantes, para a Austrália por exemplo. O primeiro "Extreme Clipper" a ser construído foi desenhado por John W. Griffeths da firma Howland & Aspinwall de Nova Iorque tendo sido iniciada a sua construção em 1843 e sido lançado á água em Janeiro de 1845.

 

A base do Mastro Grande, que media mais de 47 metros de altura e o sarilho para manobra dos cabos que estão aduchados nas mesas de malaguetas.

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Na época dos "Extreme Clippers" foi aperfeiçoada a técnica, já existente desde os anos 20, dos "composite ship" construídos com base numa estrutura de ferro forjado - principalmente as balizas - e recobertos a madeira, quilha incluída, tendo atingido a sua maturidade em 1843 com o SS Great Britain. Este tipo de construção subsistiu até á data da abertura do Canal do Suez em 1869. As ligações das madeiras à estrutura de ferro forjado eram efetuadas com parafusos de liga “Muntz” (latão) que podiam ser usados para qualquer finalidade para a qual o cobre fosse utilizado, e a indústria naval aceitou esta liga mais do que qualquer outra. Em 1800, o metal ganhou popularidade como uma alternativa mais barata ao cobre para o revestimento de cascos de barcos.

O método de construção do casco foi o de “Composite Ship”

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“Cutty Sark” – Greenwich - 1977

 

Cutty Sark 1977.jpg

 

Depois de pronto o “Cutty Sark” tinha as seguintes medidas e tonelagem:

 

  • Comprimento – 64,8m ou 64,6m (212ft 6in)
  • Boca – 11m (36ft)
  • Calado – 6,4m (21ft)
  • Tonelagem – 2001T
  • Deslocamento – 963grt (Tonelagem Bruta de Registo)
  • Capacidade de carga – 1.300.000Lb (589.670kg) de chá.
  • Comprimento total do cordame (aparelho fixo e de laborar - enxárcia) - 11 nMi (20.38502km)
  • Total de velas do aparelho - 34 (equivalente a 10 campos de ténis)
  • Velocidade de ponta - 17,5 nós (32.43072km) - (equivalente à de um barco a vopor da época de 3.000 cavalos de potência).

 

Esquema básico das velas de um clipper nos mastros do Traquete e Real (com vento fraco)

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 (continua)

 

Um abraço e...

Bom Ano e bons ventos.

 

 

 

01.06.15

20 - Modelismo Naval 4 - Os Fabulosos Clippers da China - Parte 5


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Caros amigos

 

(continuação)

 

9 - "Thermopylae"

 

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O "Thermopylae" foi construído nos estaleiros de "Walter Hood & Co." de Aberdeen, Escócia em 1868, segundo desenho de Bernard Waymouth de Londres. Era um navio de construção mista (madeira e ferro), tinha 64,62m X 10,97m X 6,33m e uma tonelagem de 991 T. Foi armada em galera, com velas de sobrejoanete, velas de joanete singelo e velas de gávea duplas.

 

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O "Termopylae" enquanto jovem, com a armação de galera original...

 

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 ... e o plano de linhas do navio

 

Citando do "Aberdeen Herald" de 22 de Agosto de 1868:

"Foi lançado à água, na quarta-feira, no estaleiro dos Srs. "Walter Hood & Co." um navio de 1300 toneladas, de construção mista (ferro e madeira), propriedade dos Srs. "George Thompson & Co."(1) e comandado pelo capitão Edward (2), antigo comandante do "Ethiopian". O navio que foi baptizado de "Thermopilae" pela Srª. Hardy Robinson of Denmore, foi totalmente construído dentro dos procedimentos aprovados, com os materiais mais duráveis, e classificado na classe mais alta da "Lloyd's"(3). O navio está destinado ao comércio entre Londres e a China".

A madrinha de um navio era sempre alguém importante para os proprietários, muitas vezes um membro da família. Não há informação específica sobre a Srª. Hardy Robinson of Denmore. Pesquisei na net e o que encontrei não é específico, mas pode ser.

O que encontrei:

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Aguarela da casa  em Denmore nos arredores de Aberdeen, com data de 21? ou 24? de Julho de 1848

 

Existe um estado de Denmore a norte da cidade de Aberdeen. Em 1868, era propriedade de um Sr. Thomas Adams (1842-1919) ou dos pais. Thomas Adams foi um proprietário de navios de Aberdeen e poderia ter sido sócio da firma "George Thompson & Co."  Em 1868 tinha 24 anos. Por outro lado existe ou existiu, uma família Hardy Robinson em Aberdeen (encontrei um ramo na Nova Zelândia).

Que tal casar-mos o sr. Thomas com a srª Hardy e resolver o assunto do apadrinhamento do "Thermopylae"?

Não é possível. Noutro lado encontrei que este Thomas Adams foi casado com uma tal Elizabeth Livingstone que não faz parte desta cena.

Mas isto são especulações, pistas a investigar, o que só seria possível se fosse a Aberdeen consultar arquivos. Como não vou, o mais provável é que a Srª. Hardy Robinson of Denmore fosse uma figura proeminente na época (a proprietária do estado de Denmore, por exemplo) e por isso ter sido convidada a ser madrinha do "Thermopylae"! Fiquemo-nos por aqui!

Mas porquê "Thermoplilae"?

No séc. XIX o conhecimento dos clássicos era coisa de bom tom e estava na moda romântica do século (nas classes possidentes). E conhecer as "estórias" do grego Heródoto fazia parte da cultura. E Heródoto escreveu sobre as Guerras Médicas, entre Gregos no geral (naquela altura a confusão era maior que hoje, pois não havia um estado grego mas sim várias cidades estado - e daí talvez não fosse maior!) e Persas.

No espaço entre 490 a.c. e 479 a.c. (11 anos) houve 3 guerras Médicas e várias batalhas.

Muitas ficaram célebres - que toda a gente conhece - destacando-se por exemplo: a batalha da Maratona em Setembro de 490 a.c., a batalha naval de Artemísio em Setembro de 480 a.c.. e a batalha das Termópilas em 480a.c., estas duas últimas foram simultâneas.

A que nos interessa é a batalha das Termópilas entre o exército Persa comandado pelo rei Xerxes e os Gregos (grosso modo) comandados pelo rei da cidade estado de Esparta, Leónidas.

Termópilas é um desfiladeiro (que na altura se encontrava muito mais perto da linha da costa do que hoje) e que foi defendido por 300 espartanos e 4.900 guerreiros de outras cidades estado (Heródoto) para impedir a penetração dos persas no interior da Grécia, em direcção a outra cidade estado - a de Atenas. Do lado da Pérsia, nada mais nada menos do que 2.600.000? guerreiros (Heródoto).(4)

Os Gregos conseguiram manter a posse da passagem do desfiladeiro durante 2 dias mas foram traídos por um grego local de nome Efialtes que mostrou aos Persas um caminho que rodeava o desfiladeiro, o que lhes permitiu atacar os Gregos pela retaguarda. Sabendo disto, Leónidas mandou recuar o resto do exército para Atenas e ficou reduzido a 300 Espartanos mais 1100 soldados de outras cidades estado a defenderem o desfiladeiro.

Ao fim de 3 dias os Gregos foram derrotados após uma feroz resistência. Poucos sobreviveram!

Tinham conseguido atrazar a penetração dos persas até Atenas durante 7 dias (incluíndo 4 dias da batalha naval de Artemísio) tendo possibilitado a evacuação de Atenas, que foi depois conquistada pelos Persas.

Quem se quiser entreter a recordar a História no "Canal História" e ensiná-la aos filhos e aos netos, aqui fica um link sobre...

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A Batalha das Termópilas

 

O nome que foi dado ao clipper deriva da batalha das "Termópilas" ou melhor, do "espírito" da batalha que tem servido de inspiração a muita gente e para muitas coisas, como exemplo de solidariedade, coragem, persistência, patriotismo, etc. Não é de admirar que numa época romântica tenha sido adoptado como nome de um navio que pretendia ser - e até certo ponto foi - o melhor do mundo.

O "Thermopylae", ostentava como figura de proa uma estátua do rei espartano "Leónidas".

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Lamentavelmente a fotografia só deixa adivinhar a figura de proa (á esquerda da fotografia). Trata-se do rei Leónidas, do "Thermopylae" quando atracado em Mill Bay, Victoria, Canadá

Um episódio interessante relacionado com o navio e as estátuas e que atesta a picardia entre tripulações do género de "o meu navio é melhor do que o teu", é o de o "Thermopylae" ter sido presenteado uma ocasião com uma estátua de um galo dourado que foi colocado no topo do seu mastro principal. Uns dias depois desapareceu do seu "poleiro".Tinha sido roubado e foi descoberto no topo do mastro principal do clipper "Taeping", seu rival. Possivelmente resultado de uma aposta! Claro que foi devolvido ao seu legítimo dono.

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 Um modelo do "Thermopylae" nos nossos dias, onde se pode observar (mal) a figura de proa bem como a cor original do navio, o verde, que identificava os navios da "Aberdeen White Star Line" bem como...

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 ... a bandeira da companhia "George Thompson & Co."que também os identificava

O navio foi construído direccionado ao comércio com a China onde o chá, a seda e as porcelanas representavam os produtos principais.

A sua primeira viagem foi em 1868 de Aberdeen para Londres, sob o comando do capitão Edward.

De 1868 até1874, sob o comando do capitão Robert Kemball que tinha sido comandante do clipper "Yang-Tze" anteriormente, fez as seguintes viagens:

Em 1868 zarpou, na sua viagem inaugural, de Gravesend para Hobson's Bay em Melbourne, em 63 dias o que constituiu um recorde da passagem mais rápida;

Em 1869 de Newcastle, NSW, Austrália, para Shangai em 31 dias e de Foochow para Londres em 91 dias;

Em 1870 de Shangai para Londres em 105 dias;

Em 1871 de Shangai para Londres em 103 dias;

Em 1872 saiu de Shangai com um carregamento de chá para Londres, em companhia do "Cutty Sark". Durante duas semanas competiram um com o outro até o "Cutty Sark" ter perdido o leme depois da passagem do estreito de Sunda. O "Thermopylae" chegou a Londres sete dias antes do seu rival;

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 "Thermopilae" e "Cutty Sark" na corrida de 1872

Em 1873 de Foochow para Londres em 100 dias;

Em 1874 de Shangai para Londres em 104 dias.

 

De 1875 a (1879) sob o comando do capitão Charles Matheson:

Em 1875 de Foochow para Londres em 112 dias;

Em 1876 de Foochow para Londres em 118 dias;

Em 1877 de Shangai para Londres em 104 dias;

Em 1878 de Shangai para Londres em 110 dias;

 

Em 1881 de Foochow para Londres em 108 dias;

Em 1882 de Sidney para Start Point, Devon, Inglaterra em 76 dias.

 

Uma longa carreira no transporte do chá atingindo tempos de viagem realmente fantásticos. Mas estes tempos de viagem no transporte do chá dependiam em grande parte do carregamento feito na China. Do tempo de carregamento no porto e do tempo da estiva da carga.

O transporte do chá para os navios era feito por "sampans" que eram carregados nos cais por carregadores que trasportavam o chá, vindo do armazém, de uma forma tradicional. Estes "sampans" faziam o transbordo das caixas de chá para os clippers.

 

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 Armazém de chá na China

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 Transporte das caixas de chá para embarque nas "sampans"

 

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 "Sampans" em actividade num porto da China. Pelo fundo do desenho, aparentemente é em Pagoda Anchorage

No navio era necessário estivar a carga de um forma rápida mas inteligente. A carga tinha de ser distribuída por todos os espaços do navio aproveitáveis - o "Thermopilae" foi concebido específicamente para transporte de caixas de chá - e de forma a manter a sua flotabilidade e o seu equilíbrio.

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 Distribuição da carga do chá num clipper

 

Vejam este link. Fiquei encantado com esta pintura e com a forma como está apresentada. Reparem no "Thermopylae" que está ao fundo, no meio da pintura e que se distingue pelo casco verde, bem como nas "sampans" que se distinguém umas das outras pelas bandeiras de identificação que têm içadas e que correspondem aos navios a que se destina o chá que transportam. Não tenho a certeza - não consegui ler nenhum texto que se referisse a isto - mas penso que as bandeiras não são as de identificação dos navios mas sim dos armazéns exportadores do chá. Logisticamente tem mais lógica. As legendas são em Inglês mas mesmo que não entendam inglês, o desenho fala por si e explica, melhor que eu, como se processava o...

Carregamento de chá em "Pagoda Anchorage" no Porto de Foochow

 

 A partir daqui o percurso do "Thermopylae" muda um pouco

 

Em c.1889 foi vendido a "W. Ross & Co." de Londres;

 

Em 1890 foi novamente vendido a "Redford" Montreal, por £5.000, onde foi armado em barca 

Em 1893 zarpou de Victoria, BC, Canadá (Oceano Pacífico), em balastro, fazendo a viagem para Hong Kong em 23 dias.

E agora a surpresa para muitos:

Em 1895 foi vendido a Portugal que pretendia convertê-lo em navio escola e foi renomeado Pedro Nunes.

É uma acaso do destino ver como dois navios, que foram competidores um contra o outro durante muitos anos nas "corridas do chá", velejaram, em épocas diferentes, debaixo da Bandeira Portuguesa - o "Thermopylae", na monarquia, como "Pedro Nunes" e o "Cutty Sark", já na República como "Ferreira" e "Maria do Amparo".

No entanto, o "Thermopyla" embora tenha entrado no "rol" da armada como "Pedro Nunes", nunca foi utilizado, segundo o meu conhecimento, como Navio Escola, pois nunca foi adaptado a tal.

Por outro lado, quando chegou a Portugal em 1896, já o seu aparelho tinha sido modificado na Austrália, passando do aparelho original de galera para aparelho de barca.

É engraçado ver à venda Kits para construção de um navio que nunca existiu da forma como é apresentado ou seja, com o nome de "Pedro Nunes" e com armação em galera.

E quanto ao "Pedro Nunes", a história é simples e pode ser contada aos quadradinhos: 

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O "Thermopylae" em Sidney já com armação de barca em1882

E depois?...

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 O "Pedro Nunes" no estuário do Tejo em 1896 sem saber bem o que fazer

E depois?...

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 O "Pedro Nunes" no estuário do Tejo, aproveitado como depósito de carvão para os seus inimigos, os "steamships". Um fim digno!

E depois?...

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O "Pedro Nunes" no estuário do Tejo ao ser afundado com um torpedo pela Marinha de Guerra Portuguesa.

 

Poderemos encarar esta história como um fim digno para um clipper célebre se aceitar-mos que foi um funeral com pompa e circunstância!

Por outro lado, podemos perfilhar a ideia de que esta acção, não foi mais do que o descartar de um mono que pesava no orçamento e que era difícil de arrumar doutra forma. Mas esta acção, quanto a mim teve uma vantagem.

Em 2007 frequentei um curso prático de arqueologia naval no Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquàtica, na Avª da Ìndia, em Lisboa, integrado na "Nautical Archeology Society" inglesa e que dava direito a um caderninho de registo de acções divididas em 4 partes. Os cursos que paguei e frequentei - Introdutório e Nível 1 - deram direito a averbar nesse caderninho a frequencia do nível 1 deste certificado. Não era minha intenção virar "Arqueólogo" mas tão só, melhorar os meus conhecimentos, quer teóricos quer práticos, nesta área. E da forma como era apresentado era, para mim, aliciante. Espaçado no tempo, sem "stress".

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Para memória futura - o meu "NAS International Training and Qualification Record"

O grande problema foi que, tal como o projecto de transformar o clipper do chá "Thermopylae" em Navio Escola "Pedro Nunes" falhou, também este falhou. Não houve, com muita pena minha, continuidade. O CNANS, que estava dependente do Ministério da Cultura, fechou as portas e foi substituído por outro organismo que nunca mais me ligou nenhuma. Nunca mais houve hipóteses de obter créditos quer para o nível II quer para o nível III já que o nível IV só depende de nós.Tenho alguma correspondência que enviei, sem obter qualquer resposta. Foi pena!

Mas qualquer coisa ficou. Durante o curso e sendo todos  mergulhadores da "pesada", - menos eu que fiz mergulho em vários lados mas sempre de maneira "leve" - muito virados para o mergulho técnico e com actividade prática anual de muitas horas e envolvidos em campanhas, havia pessoas, com quem contactei, que me falaram no sítio do naufrágio do "Pedro Nunes" situado a 30 m de profundidade, no Tejo, para os lados de Cascais, que tinha sido encontrado por um grupo de megulhadores em 2003.

E aqui está a única vantagem do afundamento do "Thermopylae" - veio contribuír para aumentar o escasso número de sítios de naufrágios existentes em Portugal. Este sítio tem sido explorado de uma forma arqueológica. Para quem tiver interesse, deixo aqui um link:

 Sítio submarino do clipper "Thermopylae" no Tejo

 

 Depois deste arrazoado,vamos ao objectivo final deste post:

 

 O meu clipper

No meu post nº 14, falo de um clipper que tentei engarrafar mas como não me estava a agradar, pu-lo de parte, e mais tarde montei-o como diorama. Nesse post não ficou bem explícito quando é que o terminei. Foi em 1995.

Na altura, já me tinha embrenhado na construção naval do séc. XIX e já tinha tido vários contactos com clippers e escunas. Não de 1º grau. Mas em segundo grau, já conhecia o "Thermopylae" e tinha ficado maravilhado com o aspecto dele a navegar. Fiz o que pude com um mau começo, mas fiquei condicionado ao tamanho do barco que tinha de caber na garrafa. Fui adaptando e eis o que ficou. Ainda hoje, quando olho para o trabalho, não fico satisfeito.

A "debrum" castanho das velas foi propositado pois pretendia representar o uso das mesmas. Era um castanho suave. Hoje, passados 20 anos, escureceu com o tempo e está horrível!

 

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Hoje é "Dia Mundial da Criança".

Queiram ou não acreditar, trabalhei hoje 10 horas neste post. E a maioria do material já estava alinhado! 

Esta pressa é porque quero oferecer este meu trabalho às crianças no dia delas.

Dedico este conjunto de post's sobre "Os Fabulosos Clippers da China" a todas as crianças do mundo, em especial aos meus netos Tiago e Pedro  e a todos os meus/minhas sobrinhos-netos.

 

"Um Povo que não conhece a sua história, não compreende o seu presente e não projecta o seu futuro."

 

Não me lembro de quem é esta citação ou sequer se estou a citar! Se não for de ninguém, é minha!

 

(1) - George Thompson & Co. dirigiam a "Aberdeen White Star Line".

(2) - O capitão Edward, só levou o navio de Aberdeen para Londres. Nunca mais lhe pôs as mãos. Já nesta altura a imprensa era assim!!

(3) - A "Lloyd's Register of Shipping" fundada em 1760 foi, e é, uma organização que, desde a sua fundação, tem pugnado pelos mais elevados níveis de qualidade na construção de navios. Uma espécie de normas ISO. A classificação era dada por uma letra do alfabeto para o casco, sendo A a melhor, seguido de um número para o conjunto dos mastros, das velas e de outros acessórios, sendo 1 o melhor. O "Thermopylae" foi classificado em A1.

150px-Lloydsloadlinecuttysark.jpgLloyds_Register_Logo.png 

O registo da Loyd's feito no casco. Neste caso trata-se do casco do "Cutty Sark" E o actual logotipo da Lloyd's

(3) - Modernamente, numa análise mais realista, estima o número de invasores em 300.000 e o número de Gregos na totalidade em 7.000 

 (conclusão e...fim)

 

Um abraço!

Bons ventos!