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Mar & Arte

Artesanato Urbano de Coisas Ligadas ao Mar (e outras)

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20.10.22

64 - Modelismo Naval 7.1.1 - Dois Barcos - Caravela Redonda ou de Armada


marearte

 

ib-04.1.jpg

(início)

Caros amigos

Navios do Descobrimento

 

"Os nomes das especias, ou maneyras dos nauios, & barcos,

assy dhum genero, como do outro, são quasi incomprensiveys:

assy por serem muntos, como polla munta mudãça que fazem de tempo a tempo,

& de terra em terra." sic

in: "O Livro da Fábrica das Naus", escrito c.1580 pelo Padre Fernando Oliveira, segundo leitura de Henrique Lopes de Mendonça  (Ver) publicada em 1898.

"O Livro da Fábrica das Naus", OLIVEIRA, Fernando

Edição Academia de Marinha, Lisboa 1991, pág.76

 

Desde a "Barca" á "Pinaça" , passando pela(s) "Caravela(s)", pela "Nau", pela "Naveta", pelo "Galeão", pelo "Patacho" e pela "Fragata", tudo nomes portugueses de navios à vela usados na época dos Descobrimentos, alguns deles muito pouco conhecidos ou com leituras diferentes e controversas, classificações funcionais ou morfológicas contraditórias e ausência de fontes fidedignas (algumas fontes desenhadas e escritas provaram não ser corretas na sua totalidade, como no caso do "Livro de Traças de Carpintaria" de Manoel Fernandez em que algumas vezes os textos não estão condizentes com os desenhos que, também por sua vez, alguns deles estão errados) torna-se difícil para um leigo ficar com uma opinião abalizada sobre nomenclaturas de navios e conseguir ter uma ideia clara (embora necessariamente aproximada) dos "Navios dos Descobrimentos".

Quando me iniciei nestas lides do Modelismo Naval Geométrico e de Arsenal, procurei documentar-me o mais possível em fontes históricas e estabeleci um princípio que é o de nunca iniciar um modelo de "barco" sem fazer uma pesquisa, o mais possível exaustiva, das várias fontes. Uma decisão que a maior parte das vezes me causou mais confusão do que esclarecimento.

A citação do Padre Fernando Oliveira que aparece no início deste texto, se na altura (1580) era válida, mais o será nos dias de hoje, decorridos quase quatro séculos e meio em que muita água correu debaixo da ponte e a enxurrada arrastou muito lixo veio estabelecer uma maior confusão.

Assim, decidi que iria, nesta questão, guiar-me pela minha opinião formada com base em duas figuras do panorama mundial nestas coisas de História Marítima Portuguesa (e não só) - os professores Francisco Contente Domingos, da Universidade de Lisboa - Departamento de História  (Ver)  (infelizmente falecido em 2021) e Filipe Vieira de Castro, Professor do Departamento de Antropologia da Texas A&M University, USA desde 2012 até ao presente e Diretor do "J. Richard Steffy Ship Reconstruction Laboratory" de 2001 até ao presente   (Ver)  - e tenho colhido o máximo de ensinamentos nestas coisas dos Navios do Mar Oceano. Tanto um como o outro, embora de uma forma diferente, abordam a temática da História Marítima Portuguesa de uma forma entendível, na minha opinião fundamentada e que me agrada. O primeiro, com base na sua grande experiência académica na área, o segundo, sendo arqueólogo subaquático, junta também uma experiência com base académica mas alicerçada  num trabalho intenso e mundialmente diversificado de pesquisa nesta vertente. 

Naturalmente que a minha finalidade não é académica mas simplesmente lúdica, pois retiro da construção de modelos de barcos em madeira uma grande satisfação que contribui para a superação do dia-a-dia que, por razões pessoais e cada vez mais de clima mundial adverso, por vezes são difíceis de superar (sem pieguice).

Até hoje, dos vários modelos de barcos que construí, só duas únicas vezes abordei barcos portugueses da época dos Descobrimentos (embora tenha acumulado montes de informações) pois, estando nos meus planos fazê-lo, nunca se tinha proporcionado uma ocasião para isso. Foi agora!

Por razões da minha saúde encontro-me, com a minha mulher, na residência sénior "Casas da Cidade" em Lisboa (passe a publicidade) há três anos, vindo de Leiria onde vivia numa moradia com uma pequena oficina de modelismo naval que, lamentavelmente, não pude trazer comigo.

Ao fim de dois anos consegui, com a boa vontade dos dirigentes da residência, um espaço no meu apartamento onde montei uma pequena oficina que tem estado “em fabricos” e resolvi deixar uma recordação que demonstre o meu agradecimento ao pessoal das "Casas da Cidade" que, compreendendo a minha necessidade de um espaço, mo proporcionaram. E esse agradecimento passa pela construção e oferta de 3 modelos de barcos, sendo dois de "Navios dos Descobrimentos" e o terceiro de outro país que a seu tempo indicarei.

Da totalidade dos 8 navios indicado no início deste Post escolhi duas Caravelas para começar pois, apesar de toda a falta de informação que ainda existe sobre este tipo de navio ainda é o que mais à vontade tinha para começar, escolha essa que recaíu numa "Caravela Redonda ou de Armada" e numa "Caravela Latina de Três Mastros" do Séc. XVI".

 

"Caravela Redonda ou de Armada"

Caravelas 1

Até hoje, o tema "Caravelas" e principalmente "Caravela Portuguesa" rodeia-se de alguma controvérsia, principalmente no meio académico ligado a estas coisas, quanto à  definição, origem, morfologia, armação e modo de navegação das Caravelas. Sabem-se umas coisas, existem protótipos navegáveis mas ao certo... não se sabe muito e as dúvidas persistem. As fontes não são muitas e a maioria delas são fontes iconográficas e textuais tais como compêndios e regimentos gerais bem como regimentos para a construção de dois tipos de caravela: a Caravela Redonda e a Caravela Antiga Meã. A Caravela Redonda é um dos navios mais importantes do século XVI.

A palavra "Caravela" encontra-se pela primeira vez na documentação portuguesa em 1255 em menção no foral de Vila Nova de Gaia. No entanto, as primeiras caravelas de que há notícia, apareceram na Itália como embarcações auxiliares de navios de grande porte em 1159. O termo grafado no Foral de Vila Nova de Gaia desaparece logo de seguida da documentação portuguesa no século XIV e só  volta a aparecer, pela pena do cronista Luís de Cadamosto, em meados do Século XV, sob a forma de um "navio latino de cerca de 50 tonéis de arqueação, 20 a 25 tripulantes e velas latinas" É referido o pormenor de terem olhos pintados de cada lado da proa, conforme tradição mediterrânica. Este tipo de caravelas, de pequeno porte, com um, dois, ou três mastros, armando velas latinas e também com remos, parece ter subsistido por mais de um século.

Lisbon_-_Lisbonne_-_Lisboa_1572.pngPanorama do Porto de Lisboa (Tejo) no século XVI, onde estão representados vários tipos de navios que se conseguem identificar:  um Galeão no centro da pintura que tem à sua esquerda, em primeiro plano duas Naus e, um pouco mais atrás destas, figuram duas Caravelas Redondas, tendo por detrás mais uma Nau que tem à sua esquerda uma Caravela de dois mastros. À direita do Galeão está uma Caravela de dois mastros, possivelmente uma Nau que se encontra em fabricos, a que se segue uma outra Caravela de dois mastros. Num plano mais afastado veem-se três Caravelas de um mastro (possivelmente de pesca) que enquadram uma outra Nau possivelmente também em fabricos. Por toda a pintura encontram-se espalhadas uma série de Caravelas de um mastro possivelmente dedicadas  algumas à pesca e também outras ao transporte fluvial de passageiros e cargas.

 

Roteiros D. João de Castro.jpg

Capa da publicação das "Tábuas dos Roteiros da Índia" de D. João de Castro - Governador do “Estado da Índia” entre 1545 e 1548. Na parte inferior desta capa, ao centro, está reproduzida uma "Caravela Redonda" ou "Caravela de Armada" desenho esse fidedigno já que foi feito, “in loco”, pelo próprio D. João de Castro. Os restantes navios desenhados são, do lado esquerdo, duas "naus", no centro, um "galeão" e as restantes 3 são "Fustas" de guerra, navios de remo com vela latina auxiliar.

Existe dificuldade de se conseguir obter informação fidedigna sobre a morfologia das caravelas, nada havendo sem ser a que consta nas fontes iconográficas e não tem aparecido até hoje, que se saiba, qualquer vestígio de naufrágio recuperável de uma caravela. (A) Afortunadamente vão aparecendo documentos técnicos da época – fontes escritas e desenhadas – que fornecem indicações que permitem uma melhor aproximação à morfologia das caravelas.

 

(Nota A) – Em 1 de Abril de 2008, na Área de Mineração 1 (MA1) da “De Beers”, na costa da Namíbia, a cerca de trinta km a norte do rio Orange no extremo sudoeste do País e a dez km, também a norte, da vila de Oranjemund, durante a prospeção realizada na “ensecada” U-60, (uma forma de exploração mineira a “céu aberto” para detetar diamantes, em que é rebaixada a zona da praia até ao substrato rochoso e defendendo-a do mar com um “muro” construído de areia) apareceram “dois tubos de bronze muito danificados, pouco depois identificados como canhões de retro carga e muitos outros vestígios, entre os quais se destacavam lingotes hemisféricos de cobre, presas de elefante, restos de madeira e moedas de ouro, que permitiam presumir provirem de um navio antigo naufragado”- in: “O navio português do século XVI de Oranjemund, Namíbia” Relatório das missões de 2008 e 2009, ALVES, Francisco J. S.

Oranjemund.jpg

Localização (marcador Vermelho) da vila de “Oranjemund” na costa da Namíbia onde se situa a MA1

Ensecadas na costa da Namíbia.jpg

Zona da MA1, na costa da Namíbia, com as várias “ensecadas” de exploração de diamantes onde apareceram, em 2008, os restos do naufrágio da nau portuguesa. A zona das “ensecadas” é a que se encontra revolvida desde a estrada que corre paralela à linha de costa e essa mesma linha de costa. O terreno que foi conquistado ao mar é defendido por um aterro construído com a areia extraída das “ensecadas” que chegam a ter entre 7 e 10 m de profundidade e conservado o mais seco possível com o uso de potentes motobombas que trabalham sem parar. Mesmo assim, veem-se zonas onde o escoamento da água é mais difícil. Esta é uma paisagem que se estende igualmente entre a foz do rio “Orange” até quase a fronteira com Angola. Toda esta zona é de alta segurança, de circulação restrita e fortemente controlada, principalmente nas saídas. Volta e meio, com um dos grandes temporais do Atlântico Sul, vai tudo, literalmente “por água abaixo”. Mas os diamantes dão muito dinheiro.

Logo a seguir a esta descoberta, especulou-se na imprensa mundial, com base na escassa informação ainda existente na altura, sobre o tipo de navio encontrado, tendo sido aventada a hipótese de se tratar da caravela de Bartolomeu Dias que desapareceu muito possivelmente naquela costa, quando fazia a viagem do Brasil para a Índia depois do “achamento”, integrada na armada de Pedro Álvares Cabral. Seria o primeiro sítio arqueológico onde se poderia “contatar” com uma caravela. Mas um “Português”, moeda de 10 cruzados em ouro que fazia parte do espólio, veio repor a verdade pois tal moeda encontrada no naufrágio, só se encontra documentado a partir de Outubro de 1525, donde não podia ser o navio de Bartolomeu Dias.

 

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Português” de Ouro – D. João III

 

A tese de ser uma caravela também caiu por terra quando foram analisados as peças do naufrágio que indicam ter sido de uma “nau”. Atualmente, através de aplicações informáticas específicas, é possível reconstituir a morfologia dos navios naufragados mesmo com poucas peças do mesmo e determinar o seu tipo, porte e pormenores da estrutura entre outras coisas. É aqui que entra o Modelismo Naval, na construção de um Modelo Geométrico do navio conforme o desenho digital, o que possibilita o estudo do navio e também alguns ensaios e posteriormente  um Modelo de Arsenal que possibilita a demonstração das soluções técnicas de construção usadas comparando, quando desconhecidas, com as atuais. 

Subsiste a dúvida se o navio ia ou vinha da Índia em virtude de parte da carga ser típica das naus que iam (lingotes de cobre que serviam para o pagamento da pimenta) e, por outro lado, dentes de elefante que normalmente vinham de África ou seja, em viagens de retorno. Se ia ou se vinha, em nenhum dos casos passaria junto á costa por alturas da atual ponto do sítio do naufrágio na Namíbia como se pode ver pela carta abaixo onde se encontram traçados os diferentes itinerários médios dos navios portugueses da “Carreira da Índia” que, na rota de ida iam das costas do Brasil em direção á passagem para o ìndico ao sul do Cabo da Boa Esperança e na rota de retorno após dobrarem o Cabo da Boa Esperança aproavam a NO até alturas de Cabo Verde entrando na Circulação do Atlântico Norte que os levavam na “Volta do Mar” em direção aos Açores (N) e depois para Lisboa (E). Tendo naufragado numa destas viagens no Atlântico Sul possivelmente numa tempestade frequente na zona Sul do Atlântico, podem ter sido arrastados até à costa Oeste de África.

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Carreira da Índia – Ida e Retorno

 Fim da (Nota A)

 

Assim, existem 4 “regimentos” (uma espécie de memória descritiva) já transcritos e disponibilizados, bem como dois desenhos de c.1616 publicados no “Livro de Traças de Carpintaria” a saber:

Nota: A transcrição para português atual é feita pelo autor deste blogue portanto, não obedece às regras oficiais da transcrição de documentos.

1 – “Medidas para fazer uma Caravela de cento e cinquenta toneis até cento e oitenta, e os paus que leva de Sobro e Pinho”;

Trata-se de uma Caravela de 12 rumos. (B)

(Nota B) Rumo – Medida linear usada na antiga construção naval equivalente a 6 palmos de goa, (cada palmo de goa mede 24,5 cm X 6 = 1,47m, cerca de 1,5m), o equivalente aproximado a 18m de comprimento de quilha medida de roda a roda. Ao comprimento total da caravela, acresce o comprimento da roda de proa e do cadaste (popa).

Existem outros valores para as equivalências entre medidas antigas e atuais que também são válidos. Estes foram os que eu adotei, de vez, a fim de manter uma normalidade nos modelos.

Fim da (Nota B)

Neste regimento aparece também informação sobre os mastros, vergas e velas do navio, podendo-se concluir por estas indicações, ser uma “Caravela Redonda”

Este regimento indica o número de peças necessárias para cada tipo de componente do navio bem como o seu tamanho e o tipo de madeira.

Este regimento encontra-se no Livro Náutico, BNL – Reservados, Cod. 2257, fls. 36-40v.

2 – “Regimento para uma Caravela de doze rumos”;

Um curto regimento mas muito complicado de entender. Exige bastante de quem se proponha usá-lo e não sei se funciona. Parece mais uma série de notas avulsas. Nem sequer tentei “desenhá-lo” tendo ficado para outra ocasião.

Este regimento encontra-se no Livro de Traças de Carpintaria, BA – Cod. 52-XIV-21, fls. 24-24v.

3 – “Conta e medida para uma Caravela de onze rumos de esquadria a esquadria”;

A exemplo do anterior, também complicado mas este entendível e possível de ser descodificado com tempo e paciência.

Este regimento encontra-se no Livro de Traças de Carpintaria, BA – Cod. 52-XIV-21, fls. 16-16v.

4 – Medidas das Caravelas antigas meãs;

Numa primeira leitura parece ser de uma Caravela Redonda que pode ser descodificado se for feita uma leitura atenta e “desenhada”. Parece interessante.

Este regimento encontra-se no Livro Náutico, BNL – Reservados, Cod. 2257, fls. 41-42v.

 

As fontes desenhadas (desenho técnico, da época)) específicas de caravelas são as que se encontram no “Livro de Traças de Carpintaria” a saber:

1 – Quilha, rodas de Proa e Popa, Caverna Mestra e Almogamas de uma Caravela  Redonda ou de Armada;

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"Livro de Traças de Carpintaria" de Manoel Fernandez -  1; Fl.107

Quilha, rodas de Proa e Popa, Caverna Mestra e Almogamas de uma Caravela  Redonda ou de Armada: trata-se do primeiro desenho (quase) técnico conhecido ,relativo a qualquer tipo de caravela

Legendas das figuras

  • Este é o modelo da Caravela armada com quilha e roda;
  • Este é o modelo por onde se tira a caverna mestra;
  • Este é o modelo da caverna mestra;
  • Este é o modelo da “almogama*” de popa digo que a “almogama” de proa;
  • Este é o modelo da “almogama” de popa.

*almogama – Última caverna do navio que, por causa do boleamento da proa/popa, tem os paus mais unidos

 

2 – Primeira e Segunda cobertas, Leme e Casco de uma Caravela;

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"Livro de Traças de Carpintaria" de Manoel Fernandez -  2; FLs. 107v e 108

1ª e 2ª Cobertas, Leme e Casco de uma Caravela

Legendas das Figuras

  • Este é o modelo da Caravela acabada como por esta traça s mostra;
  • Este é o “petipé*” da medida desta caravela – Petipé de 25 palmos;
  • Este é o modelo do leme desta Caravela;
  • Este é o modelo da segunda coberta (C) desta Caravela com todas suas larguras e medidas como se verá no regimento;
  • Este é o modelo da primeira coberta.

*Petipé – do Francês “Petit Pas” (pequeno passo) hoje, um passo de “ ballet”, que equivalia na altura, a uma escala gráfica pois era disso que se tratava.

(Nota C) - Nos navios de vela antigos, ao contrário de nos atuais, a ordem das cobertas era contada da quilha para o convés. Asim, a segunda coberta é a de cima.

 

 

Os várias tipos de caravelas que existiram podem ser agrupados, entre outras formas, quanto ao número de mastros:

 

Caravela de 1 mastrousada com diferentes funções entre a pesca e o transporte de passageiros e carga fluviais e em navegação de cabotagem (pequenas distâncias na costa); normalmente de “boca aberta” ou com um pequeno abrigo à popa; algumas com remos auxiliares.

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Caravela de 1 mastro

 

Caravela de 2 mastros usada ao longo dos tempos já no início dos Descobrimentos, a partir de c.1440, após e a par com a “Barca”.

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Caravela de 2 mastros        

Barca.jpgBarca

Nota: O navio em que Gil Eanes dobrou o Cabo Bojador na costa de África em 1434 era uma “Barca”, que tinham aparelho redondo. Segundo o comandante Gago Coutinho que se debruçou sobre o assunto, este fato levou a que Gil Eanes, para regressar a Portugal tivesse de usar a “Volta do Mar” que passava pelos Açores, já descoberto nessa data, "Volta do Mar" essa que os navios da “Carreira da Índia” usaram durante a sua existência.

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Volta do Mar” – A viagem de Gil Eanes segundo o comandante Gago Coutinho

A caravela latina de dois mastros foi o principal navio dos Descobrimentos durante a segunda metade do século XV.

 

Caravela de 3 mastrosSegundo Pimentel Barata, existem probabilidades da caravela latina de 3 mastros ter aparecido pelos finais do século XV, embora só exista documentação do seu aparecimento datada do primeiro quartel do século XVI. Esta caravela teria dois pavimentos à popa, tolda e chapitéu aberto à ré e uma mareagem de grades à proa. Mais do que isso seria impossível por causa da manobra da verga.

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Caravela de 3 mastros

Também segundo Pimentel Barata, esta caravela teria uma tonelagem de 100 tonéis, o que é perfeitamente aceitável dado o comprimento da quilha que é necessário para implantar três mastros.

 

Caravela de 4 mastros (redonda ou de armada) - A caravela redonda ou de armada sucedeu à caravela de 3 mastros pelo segundo quartel do século XVI substituindo-a gradualmente, segundo também Pimentel Barata. No entanto, Francisco Contente Domingues julga ser provável que a caravela redonda tenha aparecido mais cedo, possivelmente já integrando a armada da viagem de Pedro Álvares Cabral.

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Caravela de 4 mastros ou Redonda

A armada de Cabral integrava três ou quatro navios do tipo caravela. Podem ter sido do tipo redondo por duas ordens de razões: a caravela latina de dois mastros tinha provado ser frágil como navio transoceânico e, além disso, a rota para a Índia já era conhecida, com a consequente possibilidade do aproveitamento de ventos constantes pela popa.

Assim as caravelas da armada de Pedro Álvares Cabral podem muito bem ter sido caravelas de três mastros (pondo de lado as de dois mastros), mas com pano redondo no traquete, como se usava ocasionalmente na navegação no mediterrâneo e faz todo o sentido que tal tenha sido decidido logo desde o início nesta viagem.

Esta mudança, se existiu, teria permitido a rápida transformação da mareagem de grades existente à proa para um pequeno castelo de proa com um pavimento coberto e o fecho do chapitéu aumentando a tonelagem, e com o tempo, levado ao acrescentamento de um quarto mastro latino, aparecendo consequentemente a caravela redonda tal como aparece nos textos técnicos.

As caravelas redondas tiveram uma utilização ótima nas armadas na Índia, e nas de guarda-costeira no estreito de Gibraltar, nas ilhas e no Norte de África.

Quando D. Manuel decide enviar navios para os Açores a fim de proteger as naus da Índia de atos de pirataria ingleses e franceses, ou quando forma a armada do Estreito, seguramente que os navios eram caravelas redondas ou de armada, com porte suficiente para a ação militar naval.

A dimensão e a forma do casco tornam esta caravela incapaz como cargueiro para viagens de longa distância. Em contrapartida, o aparelho e as qualidades marinheiras adequavam-se a missões navais. Tanto nas situações referidas como nas viagens para o Oriente, como elemento principal de combate ou no apoio aos navios de maior porte, a caravela redonda ou de armada foi verdadeiramente o primeiro navio criado para a guerra de alto-mar, muito provavelmente logo desde a viagem de Pedro Álvares Cabral.”

Fonte: “Os Navios do Mar Oceano – Teoria e empiria na arquitectura naval portuguesa dos séculos XVI e XVII”, DOMINGUES, Francisco Contente, Centro de História da Universidade de Lisboa, Lisboa Maio de 2004

As informações para este Post vieram essencialmente do livro acima referido bem como das obras referidas no texto.

 

É este o navio do qual se apresentará um mini modelo, montado em diorama (simples), no próximo post 65 deste blogue.

 

Bons ventos e...

Um Abraço

 

 (continua)