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Mar & Arte

Artesanato Urbano de Coisas Ligadas ao Mar (e outras)

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Artesanato Urbano de Coisas Ligadas ao Mar (e outras)

15.04.15

11 - Modelismo Naval 2 - Um Junco Pirata Chinês


marearte

 

 

 

 

 

 

 

 Caros amigos

 

Em 2004, foi publicado em Portugal pela editora "Publicações D.Quixote", um livro polémico da autoria de Gavin Menzies com o título "1421, o Ano em que a China Descobriu o Mundo".

 

Em traços gerais, o livro defende que o mundo Ocidental foi descoberto entre 1405 e 1433 pelas esquadras do almirante Zheng He que realizaram sete viagens marítimas, 3 para Oriente (Pacífico) e 4 para Ocidente (Índico) tendo visitado neste último oceano a Índia, o Golfo Pérsico, a Península Arábica, o Mar Vermelho, a costa de África até Mombaça e, hipotéticamente, terá dobrado o Cabo da Boa Esperança tendo entrado no Oceano Atlântico e abordado o Sudoeste Africano.

 

Esta parte da história (com excepção da passagem do Índico para o Atlântico) é factual e documentada.

 

O livro de Menzies tem como base estes factos que são históricamente aceitáveis. E digo aceitávais pois todos nós olhamos para a história segundo a nossa perspectiva, a nossa maneira de ver as coisas. E muitas vezes não aceitamos a perspectiva dos outros, baseada em "factos" controversos não provados, mas alicerçamos os nossos pontos de vista em "factos" semelhantemente controversos (por exemplo a "política de sigilio" nos descobrimentos).

 

Mas o desenvolvimento que o autor faz na sua abordagem à descoberta do mundo pelos chineses é bastante controversa, cheia de falhas, contradições e erros e baseada na hipotética existencia de documentação entretanto desaparecida?!

 

(Ver http://www.gavinmenzies.net/china/book-1421/ )

 

Naturalmente que tal controvérsia tem como contraparte o Portugal que se orgulha dos seus Descobrimentos. Do nosso lado, a par de intervenções lúcidas e factuais, têm aparecido outras  bastante emotivas e falhas em argumentos. Incluíndo de pessoas de referência que confessam nunca ter lido o livro?!... mas que o atacam veementemente.

 

Eu li o livro em 2004 e tal facto despertou-me a curiosidade. Não  concordo com as conclusões e com muito do raciocínio de Mendies, mas também não discordo na sua totalidade. Sou céptico e como tal aguardo novas provas. Lembro-me sempre de outra controvérsia sobre o descobrimento da Austrália em que existe uma versão - James Cook, 1770 -  inatacável porque blindada, embora haja provas em contrário. Cristovão de Mendonça, 1522/Gomes Sequeira, 1525 /Willem Janszoon, 1606 e até os chineses - o que não é nada de espantar - são fortes candidatos à "descoberta" ou ao "achamento".  Para mim, com base no Atlas de Vaillard de 1547, a melhor hipótese é a de Cristovão Mendonça. James Cook tomou posse da Austrália em nome da Inglaterra. Não a descobriu nem achou. Isso já tinha sido feito. Este é um facto.

 

No entanto, não foi esta controvérsia que despertou a minha curiosidade. A minha curiosidade foi desperta principalmente pelo tipo de navios que existiam na China na altura. Juncos tipo "super petroleiros". E, esquecendo a polémica, foi por aqui que eu enveredei, pelo aprofundamento do conhecimento da construção naval na China antiga. E é interessante a verificação de algumas teorias que parecem contradizer a supremacia do mundo ocidental. Pelo menos na área da construção naval.

 

Para melhorar a minha compreensão, socorri-me de algumas fontes impressas:

 

- O "Fighting Ships of the Far West" obra em 2 volumes da autoria de Stephen Turnbull e profusamente ilustrada por Wayne Reynolds, publicada em 2002 e que aborda a construção de navios de guerra na China e no Sudoeste Asiático no período de 202 AC a 1419 (1º volume) e no Japão e Coreia no período de 612 AC a 1639 (2º volume), obra que me encantou;

 

e

- o relatório de trabalho de campo " Maritime Archeology in the People's Republic of China" do Australian National Centre of Excellence for Maritime Archeology de 1997, um documento recheado de evidências arqueológicas navais referentes à construção naval na China;

 

bem como de algumas fontes iconográficas.

 

 

 Paciência de Chinês 1 - Um modelo do "Junco do Tesouro" (Bao Chuan em Chinês)

 

 

Paciência de Chinês 2 - Um pormenor do "castelo de popa", se assim lhe podemos chamar

 

Os  "Juncos do Tesouro" mediam entre 120 e 130 metros de comprimento e tinham por volta de 50 metros de boca (esta informação pode ser exagerada mas é a oficial). Uma Nau da Índia de 3 cobertas (das maiores que se construíram) tinha +- 38,22 m de comprimento e 13,84 de boca (in "Livro de Traças de Carpintaria").

 

 

Paciência de Português

 

Numa ida a Londres em 1994 encontrei na loja do Museu Marítimo de Greenwich num canto onde se encontravam meia duzia de coisas em "saldo" uma capa de plástico que continha um "blue print" da Amati de um "Giunca cinese pirata" à escala de 1:100, bem como um memo com indicações para a montagem. O preço de 1£ era convidativo e comprei-o, mas nunca mais lhe liguei.
 
Passados dez anos, depois de ter lido o livro de Gavin Menzies lembrei-me da existência deste plano e, após algum tempo de frustração por não saber onde o tinha posto, lá o encontrei numa pasta francesa onde guardava tudo... menos planos de barcos.
 
Antes de iniciar a construção do junco achei que me devia documentar melhor e foi nessa altura que li, estudei e consultei as duas obras que indiquei e procurei obter alguns acessórios para o junco, que não tinha, o que consegui junto da Amati pois o junco ainda estava à venda na altura. Assim, comprei os canhões que são numa escala e forma não muito comuns e seriam difíceis de obter de outra forma, bem como as âncoras chinesas que, por acaso, descobri na minha pesquisa. O esquema da pintura dos painéis de popa e de prôa, bem como das figuras interiores foi a Amati que teve a amabilidade de me ceder fotografias.
 
Em finais de 2006 iniciei a construção do junco com materiais que já possuia e que também adquiri na altura e terminei a obra em princípios de 2007.
 
 

Eis a obra:

 

 

1-Vista geral do Junco

 

 

 

 2-O Junco visto pela proa, de bombordo

 

  

3-Outra vista, com o convés mais em pormenor, pela proa, de bombordo

 

 

4-Vista geral pela proa, de estibordo

 

 

5-O painel pintado da proa

 

 

6-Vista geral de estibordo

 

 

7-Vista do castelo de popa com os varandins, pela alheta de estibordo

 

 

 8-Os batéis auxiliares

 

 

9-Pormenor do tombadilho do "castelo de popa"

 

 

 

 10-Escada de estibordo para acesso ao Junco

 

 

11-Pormenores do convés a meio do junco com poço de acesso ao porão

 

 

12-Sarilhos da vela Principal

 

 

13-Outro ângulo da zona dos sarilhos da vela Principal

 

 

14-Sarilho da vela do Traquete

 

 

15 - Vela da Mezena

 

 

16-Vela Principal

 

 

17-Vela do Traquete

 

 

 

18-Um pormenor do convés (tombadilho do "castelo da popa" e acesso ao porão vistos de estibordo)

 

 

19-O convés visto de estibordo

 

 

20-Dois canhões em pormenor

 

 

21-O costado e convés vistos de estibordo

 

 

22-A âncora de estibordo

 

23-O leme

 

Este modelo é um modelo geométrico e não é para venda. Faz parte da minha colecção particular. No entanto aceito encomendas para construír "irmãos"destes. É só pedirem.

 

E é tudo.

Bons ventos e até à próxima,

 

Mar & Arte

 

Atempadamente (para não dizer PS) - As 2 fotografias que apresento do modelo do "Junco do Tesouro", foram retiradas da internet hà bastante tempo e estavam no meu computador. Voltei a procurá-las na internet mas não consigo encontrar a fonte. Lembro-me que se tratava de uma equipa de arqueólogos chineses que estavam a construír o modelo de um junco do tesouro para um museu nacional de qualquer coisa, na China. Se por acaso elas desaparecerem do meu blog é porque fiz asneira e estou a usar uma coisa que não devia. Se for o caso, as minhas desculpas.